02 agosto 2010

O Adultério Envolvendo o Pastor

O Adultério Envolvendo o Pastor - Parte 1


Há cinco anos fiz um trabalho em uma das matérias do meu curso de Doutorado em Ministério, falando sobre Aconselhamento de Pastores que caíram em adultério. Esse trabalho foi lido por alguns pastores que me pediram cópia e agora sugeriram que eu compartilhasse minha experiência em aconselhamento de colegas de ministério, uma vez que a leitura do trabalho foi útil para eles na prevenção, ao surgir o mais ínfimo sinal de que a tentação está batendo à porta. Como já tive a oportunidade, em vinte anos de ministério, de participar da disciplina de cinco pastores por causa desse pecado, e de ter acompanhado pastoralmente três deles, resolvi fazer uma adaptação daquele trabalho, colocando-o numa linguagem menos acadêmica e mais prática, visando atingir como público-alvo tanto os pastores (na expectativa de que tal matéria sirva de alerta e alento para as lutas pessoais que nós enfrentamos sozinhos em nosso íntimo, sem ter com quem compartilhar) como também as ovelhas (na expectativa de oferecer algumas sugestões de como elas podem “apascentar seu pastor” antes que seja tarde). Na época em que me foi solicitado escrever sobre isso, havia em nossa região um caso de disciplina de pastor, razão pela qual resolvi não tocar no assunto. Mas faço-o agora, aproveitando que o Senhor está nos concedendo um período de refrigério nesse tipo de tribulação. O conteúdo desse tema será dividido em cinco ou sete estudos, que vou tentar publicar semanalmente aqui em nosso blog, a fim de não se tornar uma leitura cansativa, e também para que você possa meditar em cada parte separadamente. A solicitação que faço a você, que estará lendo estes artigos, é que envie seu comentário ou dúvida usando o formulário de resposta deste blog, logo abaixo da mensagem.

INTRODUÇÃO: UMA DEFINIÇÃO BÍBLICA DE “ADULTÉRIO”

Escrever sobre um assunto tão triste é chato, mas é pior quando a gente fica sem refletir nos perigos que diariamente nos cercam. Um caso de adultério jamais se estabelece de uma hora para outra, mas o pecado sempre chega sorrateiramente até causar a queda. No caso de nossos pastores, a queda em adultério faz parte das maiores tragédias que poderia acontecer, pois afeta sua moral, seu trabalho e sua família. Seus sonhos e expectativas são abruptamente destruídos. Tudo que construíram em tantos anos de casamento agora sucumbindo sob intenso terremoto. Sua esposa e filhos sofrem um golpe duro, jamais imaginado. Mas o ato impensado do pastor que cai nesse pecado não agride apenas as pessoas que lhe amam. Agride também ao Deus que ama.

A preocupação de Deus com a fidelidade conjugal e tão forte que este assunto foi incluído como um dos dez mandamentos (Ex. 20.14). Desde o começo, no éden, a intenção de Deus quanto ao casamento foi estabelecida na criação, ao criar o homem e a mulher, tornando-se os dois “uma só carne” (Gn 2.24). Esta união foi também referendada por Jesus, ao interpretar, explicar e acrescentar à referência de Genesis: “De modo que não são mais dois, porém uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem” (Mt 19.6). O adultério é a infidelidade com aquela parte com a qual Deus nos ajuntou, tornando-se uma quebra do compromisso, não só com o cônjuge, mas principalmente com aquele que estabeleceu a aliança; tal infidelidade implica, ainda que momentaneamente, na separação do casal, mesmo que ainda vivam debaixo do mesmo teto. No caso da parte infiel não reconhecer e/ou confessar seu erro, ainda assim a quebra do compromisso é algo que, diante de Deus, caracteriza a infidelidade para com ele.

Gary Collins explica que a palavra “adúltero” é empregada na Bíblia para se referir a adoração de ídolos e infidelidade a Deus (Is 57.3; Jr 3.8; Ez 23.43; Tg 4.4; Ap 2.20,23), e para se referir ao intercurso sexual da pessoa casada com outrem além de seu cônjuge (i.e., sexo extraconjugal). Em ambos os casos, o adultério é proibido e fortemente condenado (Ex 20.14; Lv 18.20; Dt 5.18; 22.22-24; Mt 9.3-12; Jo 8.4). Também mostra que o apóstolo Paulo usa diversas vezes uma lista de comportamento perverso, nas quais inclui o adultério e fornicação, juntamente com “imoralidade”, “impureza”, e “homossexualidade” (I Co 6.9, 10; Gl 5.19,20; Cl 3.5). “É importante notar que a ira de Deus cairá sobre os que praticam tais coisas. Deus claramente não considera como superficiais as intimidades sexuais físicas fora do casamento” (Gary Collins, Aconselhamento Cristão. São Paulo: Vida Nova, 1984, pág. 244).

Além disso, temos ainda outro ensino significante, que é o de Jesus, no sermão do monte, fazendo uma interpretação do sétimo mandamento, e, numa época bem longe da Internet, fala do “adultério virtual”. Jesus mostra que diante de Deus até mesmo a intenção impura é algo abominável ao Senhor, e considerado por ele como adultério. “No Sermão do Monte, Jesus fala acerca do sétimo mandamento (Mt. 5:27-28; cf. Ex 20:14; Dt 5:18). No reino de Deus que começa a raiar, o adultério é um pecado que revela que o coração da pessoa é apegado ao homem, e não a Deus. Aos olhos de Deus, o olhar cobiçoso e o pensamento da concupiscência são contados como o ato completado” (Colin Brow, Ed., O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1981, Vol. II, pág. 378). Esse alerta de Jesus é de extrema relevância, uma vez que todo adultério consumado fisicamente nasce no coração quando as circunstâncias conduzem os que são tentados, levando-os a situações cada vez mais comprometedoras, até chegar num ponto quase irreversível.

Nos diversos casos que tive oportunidade de tratar pastoralmente, o pecado só aconteceu porque os pastores em questão não prestaram atenção aos indicadores e evidências de que alguma coisa estava saindo do controle. Em outras palavras, partindo do pressuposto de que ser tentado não é pecado, começaram a apreciar a tentação, e foram gradativamente baixando suas defesas. Ao fazerem isso, perderam a noção da gravidade deste pecado diante de Deus. Apesar de ensinarem suas ovelhas e de terem participado na igreja de diversas disciplinas de pessoas por adultério, com o passar do tempo e por sua própria situação, foram mudando seus conceitos na tentativa de amenizar a gravidade de seu pecado e justificar um comportamento perigosíssimo para sua pureza pessoal. A exceção à regra (de que o pastor que cai em adultério ameniza a gravidade de seu ato) traz para o pastor um peso interior ainda maior. Refiro-me à situação de um colega pastor que sabia e era consciente de tudo isso, mas ainda assim caiu. Seu coração era mais amargurado porque quase não podia acreditar na “burrice” que havia feito, mesmo tendo plena consciência de cada passo que estava dando. Chegou a achar, por isso, que seu erro era imperdoável e inalcançável pela graça de Deus.

Ao concluir essa Introdução ao nosso assunto, deixo diante de Pai Celestial minha intercessão; primeiro por mim mesmo e meus colegas pastores, a fim de que na sua imensa misericórdia o Senhor nos conceda a honestidade suficiente para diagnosticarmos os riscos que corremos ao lidar com nossas fraquezas e tentações; oro também por nossas famílias, que fazem parte de nossa vida e ministério. Também oro pelos líderes e demais ovelhas a fim de que Deus lhes conceda a visão de que seu pastor é homem e, como os demais membros da igreja, também carece de pastoreio e acompanhamento “pastoral”. Aliás, por causa da natureza de seu trabalho, seu pastor está muito mais exposto a situações de tentação que os demais membros da igreja. Mas esse assunto fica para o artigo da próxima semana. Por enquanto, medite sobre o conteúdo deste artigo, e envie sua contribuição para ser publicada aqui.

Rev. Saulo P. Carvalho

O Adultério envolvendo o Pastor - Parte 2


Quando se analisa todo caso de adultério envolvendo o pastor (e possivelmente qualquer membro da igreja), é possível constatar que, via de regra, o contexto que levou ao pecado era comum a todos. Eram homens que serviam a Deus no ministério, porém vacilaram em discernir os sinais que claramente se faziam perceber no dia a dia deles. E antes que você “jogue a primeira pedra”, perceba que aqueles que caíram não tinham discernimento que sua realidade era tão arriscada: foram enganados pela sua própria natureza pecaminosa. Por isso, olhemos mais de perto para o referido contexto a fim de abrir os nossos olhos e, na sua infinita misericórdia, Deus possa nos conceder o alerta para que reconheçamos a nossa própria situação de risco.

Quais são as características do estilo de vida do pastor que podem levar a este abominável pecado?

1. Ausência de Pastoreio

Em todos os casos em que pastores caíram em adultério, verifica-se que a ausência de pastoreio foi fator determinante para o estabelecimento da tragédia. Quem é o pastor do seu pastor? Com quem ele pode abrir o coração e compartilhar que está sendo tentado? A quem ele presta contas de sua vida íntima?

A grande dificuldade é que os pastores normalmente não têm alguém que possa lhe prestar assistência pastoral. Isso quer dizer que não há alguém a quem o pastor deve prestar contas de sua vida espiritual, nem quem lhe ofereça ajuda e exortação nos momentos iniciais do processo de tentação. Ninguém desempenha, para o pastor, o papel que ele desempenha na vida dos membros da igreja, tal como: conselheiro, guardião espiritual, exortador, confidente, etc. Essa solidão ministerial faz com que o pastor seja visto como uma grande fortaleza espiritual, quando na verdade ele é humano e carece dos mesmos cuidados pastorais de seu rebanho. E por ser visto como alguém inatingível pela tentação, poucos são os que se preocupam com essa área na vida de seu pastor, e conseqüentemente a igreja não proporciona o ambiente favorável ao pastoreio de seu pastor. Pelo contrário, quando o pastor resolve abrir o coração acerca de suas lutas, geralmente é mal compreendido e pode até mesmo causar escândalo. Esta realidade faz com que o pastor seja cada vez mais fechado com relação à sua individualidade e aos problemas que, como qualquer ser humano, ele também enfrenta.

2. Insatisfação Conjugal

Outra questão que torna o pastor suscetível ao pecado de ordem sexual é a insatisfação com seu próprio casamento. Essa insatisfação normalmente é gerada gradativamente, ano após ano, quando o pastor não trata das crises suas crises conjugais, ou o faz de forma superficial, resolvendo apenas o problema imediato, deixando de lado os fatores que o gerou. Dos casos que pude acompanhar, quando tratamos da possibilidade de restauração do relacionamento conjugal, afirmaram categoricamente: “se for para viver como vivemos desde que casamos, preferimos continuar separados”. Outro, falando de seu casamento, desabafou: “joguei fora doze anos de minha vida!”. Essa crise é gerada no decorrer dos anos de vida conjugal e se manifesta através da insatisfação com a freqüência e a qualidade da relação sexual com sua própria esposa. Como normalmente o pastor não tem com quem compartilhar esse tipo de dificuldade a fim de receber ajuda, a situação vai se agravando a cada dia.

3. Crise da Família

A família do pastor tem dificuldades que as demais famílias da igreja não têm. Além de não ter pastoreio, ela sofre pressões por causa do ambiente em que vive. Richard L. Mayhue alista as dez “pressões envolvidas no pastorado:
A. O pastor envolve-se com o humanamente impossível – lida com o pecado na vida das pessoas.
B. O pastor cumpre um papel que nunca se completa – resolve problemas que vão se multiplicando.
C. O pastor serve sob uma credibilidade cada vez mais questionada aos olhos da sociedade.
D. O pastor permanece a postos 168 horas por semana.
E. Espera-se que o pastor tenha um desempenho excelente em uma ampla gama de habilidades – sendo, a qualquer hora, erudito, visionário, comunicador, administrador, consolador, líder, financista, diplomata, exemplo de perfeição, conselheiro e apaziguador.
F. Espera-se que o pastor produza mensagens fascinantes, que transformem vidas, pelo menos duas vezes por semana, 52 domingos por ano.
G. A brigada de combate do pastor é, em geral, uma força voluntária, não uma ajuda remunerada.
H. O pastor e sua família parecem viver em um aquário que todos podem observar.
I. O pastor muitas vezes é mal remunerado, não muito valorizado, pouco reciclado e sobrecarregado.
J. Como figura pública, o pastor pode receber as mais duras críticas tanto da comunidade como da congregação” (Mayhue, Richard L., em “Redescobrindo o Ministério Pastoral” – John MacArthur Jr, Ed., Rio de Janeiro: CPAD, 1998, pág. 176).

Todo esse peso, vivenciado diariamente, pode fazer com que o pastor e sua família vivam intensamente para o ministério e deixem de lado sua própria vida familiar. Esse estilo de vida inevitavelmente gerará crises que se manifestarão de alguma forma: ou no casamento do pastor, ou na vida de seus filhos, ou no seu próprio ministério.

4. Envolvimento com a Pornografia

Uma das características de nosso tempo é a erotização da cultura, que nos ataca de forma contínua e agressiva. Através de revistas, jornais, televisão, out-door, etc…, somos constantemente agredidos com apelos ao sexo, à nudez ou à malícia. É certo que não podemos evitar completamente tal situação, pois vivemos inseridos neste mundo, mas muitos pastores estão se “conformando” com tal cultura. Como diz Gene E. Veith Jr., “A igreja sempre teve de confrontar sua cultura e existir em tensão com o mundo. Ignorar a cultura é arriscar-se à irrelevância; aceitar a cultura sem críticas é arriscar-se ao sincretismo e à infidelidade” (Veith, Gene E. Jr., “Tempos Pós-Modernos”, São Paulo: Cultura Cristã, 1999, pág. 6). E esse é o perigo que ronda os pastores: ficarem acomodados com a idéia de que podem ter o mesmo padrão de vida que combatem quando lidam com suas ovelhas.
Outra característica de nosso tempo que merece um destaque especial nesta abordagem é a internet. Esta se constitui em um grande perigo para a vida e integridade do pastor, principalmente considerando que quase a totalidade dos pastores tem computador em casa ou em seu gabinete pastoral, e a maioria deles tem conexão de internet. O que transforma a internet em armadilha é o anonimato com que se pode navegar; em seu próprio escritório pastoral, em horário que está a sós, sem o perigo de ser descoberto, é certo que a tentação é maior, principalmente no caso do pastor não saber lidar com as tensões e problemas relatados nos itens anteriores como, por exemplo, sua vida conjugal. Não é incomum histórias de pastores que caíram em adultério tendo a internet como instrumento inicial no processo de tentação, não apenas consultando páginas e material pornográfico, mas também mantendo diálogos inadequados via “chat”, meio pelo qual eles alimentaram uma fantasia e até mesmo chegaram a conhecer a pessoa com quem traíram sua esposa (quanto ao perigo da internet e como se prevenir, leia artigo anterior que publiquei neste blog).

5. Displicência no Aconselhamento Pastoral

O trabalho de aconselhamento é uma das atividades principais do pastoral. Thomas Oden afirma que o pastor tem uma oportunidade que não é oferecida ao psicólogo ou a qualquer outro terapeuta, pois estes precisam esperar até que o paciente venha ao seu consultório para receber tratamento. Já o pastor tem a liberdade de ir à casa de sua ovelha e abordar qualquer assunto que porventura seja necessário. Aliás, Oden ressalta que “a maioria das pessoas sente-se honrada quando o pastor a visita e algumas sentem-se desprezadas se o pastor não as visita com freqüência” (Oden, Thomas, “Pastoral Theology”, San Francisco: HarperSanFrancisco, 2001, pág. 147 – minha tradução). Além disso, os membros da congregação procuram o pastor a fim de compartilhar suas mais íntimas crises, e esse fato pode ser uma armadilha quando o pastor não está bem consigo mesmo e com sua família e casamento. A ovelha pode ver o pastor como um homem maravilhoso, que ouve, entende, ajuda, dialoga, e achar que isso não é profissional, mas afetivo. Caso o pastor não se cuide, ele pode deixar-se envolver de forma inconveniente (Alan Cury, “Theology of Ministry”, apostila não publicada). Na linguagem de David Hansen, “há um desejo de ouvir e conhecer os segredos das pessoas que é excitante, até concupiscente. Esse desejo é uma forma de voyeurismo” (Hansen, David, “A Arte de Pastorear”, São Paulo: Shedd Publicações, 2001, pág. 147 – Quer dar um bom presente para seu pastor? Esse é o livro!). Isso pode levar o pastor a começar a desenvolve fantasias no aconselhamento. Quando entra nesse processo, ele já iniciou a descida para o precipício que, caso nada seja feito para reverter tal processo, redundará em grande ruína para sua ovelha, para ele, sua família e o Reino de Deus.


O Adultério Envolvendo o Pastor - Parte 3

Quando alguém desobedece e quebra a lei de Deus, esse pecado traz conseqüências, sendo que em alguns casos tais conseqüências são leves e momentâneas, sendo resolvidas com um simples pedido de perdão e reconciliação com os envolvidos. No caso de adultério, no entanto, elas são extremamente fortes, e afetam uma área ampla que abrange o casal, os filhos, os demais membros da família, os amigos e várias outras pessoas que são direta ou indiretamente envolvidos. Quando um membro da igreja comete este pecado, ele tem o pastor para orientar, ajudar, apascentar e aconselhar, tem a comunhão da igreja para auxiliá-lo no processo de disciplina, continua normalmente com o sustento de seu emprego, e ainda pode afastar-se de suas funções na igreja a fim de tratar de sua família e seu casamento. Quando acontece de o pastor cair em adultério não é assim. Pelo contrário, ele perde quase tudo que construiu no decorrer de sua vida e de seu ministério. Acompanhando pastoralmente pastores que caíram nesse pecado é que pude compreender a profundidade da declaração de Jesus ao dizer, referindo-se ao diabo, que “o ladrão vem somente para roubar, matar e destruir” (Jo 10.10). De fato, um adultério é como um terremoto avassalador que literalmente destrói a vida de um ministro do evangelho, e faz perder tudo:

1. PERDA DO MINISTÉRIO

A primeira grande perda que o pastor tem é o seu ministério. Aquilo que era sua paixão e sua razão de viver fica maculado. Já não tem autoridade para subir ao púlpito, para ensinar, aconselhar, conduzir o povo de Deus em adoração. Mesmo seu amor pelas ovelhas que Deus lhe confiou não pode mais ser demonstrado de forma prática, no serviço. Aliás, até mesmo o período em que ele, fielmente e em santidade, conduziu seu ministério é agora questionado por suas ovelhas que costumam comentar algo como: “…bem que há uns três anos o pastor foi muito atencioso com a irmã fulana de tal…”, e por aí vão duvidando da sinceridade e honestidade do pastor.
O sentimento de que a vida só tem razão de ser vivida na perspectiva do ministério pastoral, como alguém de fato criado para aquela finalidade, esse sentimento faz com o adultério seja minimizado como um detalhe tão pequeno que causou um estrago tão grande a ponto de o pastor ter que repensar toda a sua existência. A perda do ministério é algo tão terrível para o pastor que ele chega mesmo a pensar que poderia conciliar seu ato pecaminoso com as atividades pastorais, como recentemente ouvi a história de um pastor que sustentou uma vida dupla por quase um ano inteiro. Nos casos em que pude acompanhar pessoalmente, dois deles reconheceram, tardiamente, que passaram a achar natural o desenvolvimento de seu ministério paralelamente a uma vida conjugal dupla. Essa situação é comentada por Richard Baxter ao analisar a necessidade de arrependimento por parte do pastor: “É triste pormos a nossa igreja a dormir com a nossa prédica, mas é trágico pôr-nos a nós mesmos a dormir. Quão terrível é quando falamos tão longamente contra a dureza de coração dos ouvintes, e, contudo, ficamos endurecidos e surdos ao ruído das nossas próprias repreensões!” (Baxter, Richard, O Pastor Aprovado. São Paulo: PES, 1989, pág. 70). Há controvérsia acerca do retorno ao ministério depois de ser restaurado da disciplina; nos casos citados neste artigo, apenas um foi restaurado e voltou para o ministério.

2. PERDA DO EMPREGO

Partindo do pressuposto de que a maioria dos pastores trabalha de tempo integral no ministério e, por causa disso, passa a maior parte de sua vida sem desenvolver habilidades em qualquer profissão, uma conseqüência direta da perda do ministério é a perda de seu emprego e seu salário. Como o adultério o desqualifica para a sua função, imediatamente ele se vê sem o sustento para sua família, tendo que enfrentar um mercado de trabalho para o qual ele está despreparado. A situação é agravada pelo fato de que normalmente o pastor investe seus recursos na criação e educação dos filhos, não tendo assim nenhuma reserva financeira, e como sempre morou em casa pastoral, também não tem residência própria. Além da dificuldade de resolver o problema de relacionamento com a esposa e filhos, todos ainda têm a grande apreensão com relação ao nível de vida da família, que do dia para a noite cai vertiginosamente. Como a igreja precisa buscar outro pastor e normalmente não tem estrutura financeira para arcar com o sustento de dois obreiros, o pastor sente-se desprezado e abandonado pelo rebanho a quem dedicou vários anos de sua vida. Essa amargura, aliada à crise no casamento, mais a demora e dificuldade em se situar no mercado de trabalho, gera um contexto de grande desespero, que faz com que os referidos pastores percam a esperança de dias melhores.

3. PERDA DA COMUNHÃO DA IGREJA

Aquele que antes era visto como padrão dos fiéis, alguém de uma moral inquestionável, agora é visto com desconfiança pela igreja. Tudo aquilo que pregou, falou, aconselhou e ensinou volta-se contra ele, e lhe são atribuídos os mais severos julgamentos. Suas ovelhas sentem-se traídas pelo pastor, e nesse tumulto nem mesmo aqueles mais condescendentes sabem como se portar diante dele, porque o que poderiam falar para o pastor que ele já não soubesse?  Por isso, num sentimento misto de indignação e incapacidade de lidar com a situação, quase todos abandonam o pastor. Como os vínculos de amizade do pastor normalmente são feitos no âmbito eclesiástico, todos reclamam que na hora mais terrível de suas vidas seus amigos lhes deram as costas. Sem ambiente para continuar na igreja, até mesmo por causa do relacionamento com o colega que assumiu o seu lugar, o pastor se vê obrigado a buscar comunhão em outra igreja, ou mesmo ficar recluso e gradativamente ir abandonando a igreja. E não é só o pastor: sua esposa e seus filhos, além das grandes lutas para tentar restaurar o casamento e a vida familiar, todos têm dificuldade em estar na igreja, pela vergonha que sentem da ação reprovável do esposo e pai. Tal contexto faz com que, no momento em que mais a família precisa de pastoreio, ela tem a tendência de se retrair e não permitir que sejam apascentados pela igreja.

4. PERDA DA FAMÍLIA

A última grande conseqüência que quero ressaltar aqui é que a maioria dos pastores que caem em adultério perde a família. Assim como a igreja se decepciona e se sente traída, a esposa e filhos têm um sentimento de traição muito maior. Tudo que se tinha construído em termos de comunhão, fidelidade, parceria, a própria imagem de esposo e pai, pastor, alguém que era exemplo, tudo isso se dilui em meio ao ressentimento e perplexidade daqueles que partilharam de sua vida. Somadas todas as conseqüências alistadas acima, a possibilidade de perda total do casamento e da família é muito maior do que no caso de outra pessoa que comete o mesmo erro. Imagine: sem emprego, sem salário, sem casa, sem qualificação profissional, sem comunhão com a igreja, envergonhado diante da família e de todos, decepcionado consigo mesmo e com a igreja, e isso tudo “da noite para o dia”…. é possível pastorear um pastor nessa situação? É claro que sim. É talvez uma tarefa tão difícil que poucos a aceitam. Mas quero, no próximo artigo, compartilhar alguns princípios de pastoreio aplicados a esse contexto.

Por enquanto, ressalto que a razão de estar escrevendo estes artigos é para que nós, os pastores, tenhamos consciência da loucura que é o adultério, a fim de tomarmos todas as medidas necessárias, não para corrigir uma queda, mas para fortalecer nossas defesas e assim evitarmos uma tragédia desse porte. E para aqueles que não são pastores, minha intenção é despertar seu interesse pelo pastoreio de seu pastor e sua família, pois assim você poderá ajudá-lo a preservar sua integridade e continuar sendo a bênção que ele tem sido para você, sua família e a igreja que você congrega.

Rev. Saulo

FONTE:
blog.spbc.org.br/2008/06/03/o-adulterio-envolvendo-o-pastor-parte-1/

2 comentários:

  1. Gostei muito, estava procurando algo neste assunto, muito claro e de muita ajuda aos pastores.
    Não encontrei a parte 2. Quero muito ler os demais.

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  2. PARABÉNS PELO ARTIGO, CHEGA DE TABUS, NOSSO DEUS É CLARO E SANTO

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