30 outubro 2010

Não Podemos nos calar


Não Podemos nos calar

Shalom!

Hoje em dia, infelizmente por causa de muitos escândalos e excessos que existem no meio evangélico, é comum ouvir, ler e fazer críticas concernentes a Igreja e ao meio evangélico de forma geral. Há uma indignação por parte de muitos que tem ecoado de uma forma ou de outra em nosso meio, e concordo, não podemos nos calar. Mas, fato é que existe um grande desconforto na sociedade com relação a questões ligadas aos evangélicos e também a grande fatia dos líderes denominacionais.

Ao meu modo de ver, precisamos filtrar o que vem acontecendo para que não venhamos colocar todos no mesmo pacote e descartar pessoas sinceras que estão lutando pela verdade, gente de Deus que acredita na mensagem de Jesus, daqueles que estão tentando enganar, extorquir, se aproveitar de uma fatia de desesperados.

É bem verdade que grande parte dos televangelistas, apóstolos, bispos e pastores tem causado um alvoroço alarmante na frente das câmeras. Exageros inescrupulosos têm assustado até mesmo os que não frequentam igrejas, basta apenas ter um pouco de sensatez para não ser ludibriado.

Infelizmente existe realmente um grupo, principalmente os lideres midiáticos, alguns dos crentes artistas, pastores "show man" que tem ajudado na tentativa da dissimulação do nome de Cristo por parte dos críticos e da impressa escrita e televisiva.

Mas como podemos ponderar as questões mais inquietantes que surgem como algo insolúvel no meio cristão? Existem critérios que precisam ser levados em conta na hora de considerar o que tem acontecido no meio Evangélico.

Os líderes mercantilistas, inescrupulosos, mercenários, etc, trabalham em cima de pelo menos quatro situações que todos estão sujeitos a serem explorados. Em primeiro lugar, incitam competitividade. Desde criança, somos incentivados a viver em um mundo de competição. Competimos nos jogos, na hora de se alimentar na escolinha para ver quem acaba primeiro, somos constrangidos a tirar notas boas, não simplesmente para passar de ano ou mostrar que aprendemos a lição. Compete-se a garota no colégio, na roda de amigos, e assim, vamos crescendo e continuamos competindo. Competimos por uma vaga no vestibular, competimos por uma boa vaga de emprego, e assim sucessivamente. Porém, existem competições que também são sadias, pois elas nos ensinam a valorizar-nos a nós mesmos. Mas de certo modo, muitos fazem dessas competições suas razões de viver. Há pessoas que levam isso tão ao pé da letra que sentem-se muitas vezes impelidas a eliminarem seus “oponentes”. Competem tanto que trazem isso para os seus relacionamentos mais íntimos, e inclusive para o relacionamento com Deus e igreja.

O escritor Philip Yancey escreve dizendo: “O gosto pela competição se espalha como uma doença[...]A competição nos cega, de modo a não vermos as coisas de uma perspectiva sóbria e distante. Ela nos agarra e aperta até que tudo em que conseguimos pensar é na vitória”.[1] E isso é uma grande realidade, e em nome da competição, muita gente aprende a pisotear outros nesse processo.

Você já deve ter ouvido algum líder vociferando que Deus vai tirar do ímpio para dar para os crentes. Que Deus vai humilhar aqueles que estão lhe perseguindo, não é mesmo? Ou que vai até matar alguém para lhe abençoar, ensinando assim que Deus prefere uns em detrimento do outros. Pois bem, tem igreja que declarou guerra contra Emissora de Televisão, dizendo eles, que esses são os maiores inimigos do povo de Deus, dando até a alcunha de Babilônia. Muitos fazem isso, usando texto do Antigo Testamento, esquecendo-se que a Bíblia relata ocasiões em que alguns povos se colocavam contra a formação e perpetuação do povo hebreu e não em coisas como emprego, faculdade, nos relacionamentos conjugais, familiares e nem muito menos entre os irmãos. Mas é incrível como em algumas igrejas as pessoas são incitadas o tempo inteiro a competir, a ver sempre o outro como opositor e oponente. Pelo contrário, devemos aprender a sermos humildes como Cristo assim o foi, e, a Bíblia Sagrada nos diz: “Nada façais por partidarismo ou vanglória, mas por humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo. Não tenha cada um em vista o que é propriamente seu, senão também cada qual o que é dos outros, tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus "(Fp 2.3-5).

Essas palavras do apóstolo Paulo, precisam serem levadas a sério em todas as questões, porque igrejas que trabalham em cima de competitividade, são alimentadas por essas visões de batalha, o que configura todos contra todos.

Em segundo lugar, aguçam a ambição. É interessante porque muitas pessoas acabam confundido sonho com ambição. Sonhar não é proibido, pelo contrário, os sonhos nos alimentam o espírito, nos dão sentido para a caminhada. Alguém já disse que viver sem sonhar não é viver. Realmente, mas quando os malabaristas da fé, tentam dar a essas ambições, nome de sonhos, as pessoas se dispoem a tudo, afinal de contas, quem está falando, o está fazendo, em nome de Deus. Muitos usam a Bíblia para gerar nas pessoas sentimentos que elas nunca tiveram. Concordo que existem pessoas que precisam ser estimuladas a sonhar, mas não a ambicionar.

Ligue a Tv e você verá os testemunhos mirabolantes daqueles que se dizem ter felicidade e paz. Começa normalmente assim: “quando eu vim para igreja tal, morava de aluguel, andava de ônibus ou a pé....mas depois que vim para igreja tal...”(ai vocês já sabem o resto). Desse modo, meia dúzia de gente que já tem o coração dobre, ouve essas coisas, imediatamente já querem saber qual a receita “mágica” para tal mudança radical. Ora, normalmente isso é fruto de trabalho, autodisciplina, mão de obra qualificada e objetivos bem traçados. Mas não, transferem isso para uma dimensão espiritual que causa desdobramentos inimagináveis.

Nunca podemos esquecer que Jesus foi conduzido pelo Espírito ao deserto para ser tentado, e lá, ele foi tentado pelo diabo, que usava a própria Palavra de Deus para dissuadi-lo do seu propósito maior (Mt 4.1-11). E aqui, cabe a seguinte observação, não é porque estão usando a Bíblia, que não possam estar gerando nas pessoas sentimentos distorcidos e pervertidos. A Bíblia Sagrada diz: “Ninguém, ao ser tentado, diga: Sou tentado por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta. Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz” (Tg 1.13,14). E nada que uma forcinha por parte dos mercadejadores da fé, não possa ajudar, ensinando as pessoas a despertarem não o “...o novo homem que se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou” (Cl 3.10), mas sim, o homem caído, que ama esse mundo e sua beleza. Aguçam nas pessoas sentimentos, que talvez nunca tiveram, e passam a alimentar desejos perniciosos e destruidores.

Em terceiro lugar, exploram as mazelas da vida. Todos nós temos mazelas na vida muito difíceis de se lidar. Passamos por processos dolorosos e muitas vezes desgastantes em meio ao caminho que percorrermos. Muitos estão passando por necessidades emocionais tão atordoantes que o coração está completamente dilacerado. É comum vermos pessoas que chegam ao desespero, apelando para os curandeiros, cartomantes, gurus, prognosticadores e os promotores da má fé.

Porque promotores da má fé? Porque usam as mazelas da vida para as explorar. Há pessoas que já bateram em tantas portas que podem ter certeza, normalmente o último lugar que vão é a igreja. Chegando lá, elas estão dispostas a fazerem o que for necessário para resolver seus problemas mais indesejáveis. Lécio Dornas disse: “Fugir dos problemas é sempre a nossa maior tentação. Aliás, o que não falta hoje em dia são propostas que apelam ao coração humano dizendo: Pare de sofrer! Você não precisa ter problemas! Temos algo que vai fazer você nunca mais verter uma lágrima”.[2] Nessa hora entra em cena esses que se aproveitam da desgraça alheia para sugar-lhes o dinheiro, a boa fé, o tempo, até mesmo a vida, enfim, tudo o que podem. Prometendo soluções imediatas, para causas na justiça, “portas de empregos”, dores de cabeça e outras tantas mazelas.

Exploram o máximo que podem com discursos cheios de técnicas psíquicas, revestidos de uma teatrialização gospel, show de pirotecnia e manipulação emocional. Porém, o apóstolo Pedro, já, a muitos séculos atrás alertou dizendo: “Assim como, no meio do povo, surgiram falsos profetas, assim também haverá entre vós falsos mestres, os quais introduzirão, dissimuladamente, heresias destruidoras, até ao ponto de renegarem o Soberano Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina destruição. E muitos seguirão as suas práticas libertinas, e, por causa deles, será infamado o caminho da verdade. Também, movidos por avareza, farão comércio de vós, com palavras fictícias; para eles o juízo lavrado há longo tempo não tarda, e a sua destruição não dorme”(II Pe 2.1-3).

É necessário voltar-se para Bíblia, examinar nas Escrituras para ver se realmente o que está sendo dito tem coerência, ou está dissimulando o Caminho Santo, porque muitos estão desatordoados no caminho, sem nenhuma direção porque deram ouvidos a tantas coisas que no lugar de consolar, trouxe mais sofrimento e tristeza.

Em último lugar, colocam-se na condição de sacerdotes. Aqui existe um risco muito grande e ao mesmo tempo, é um assunto bem difícil de trilhar, pois muitas pessoas confundem o ministério pastoral com ministério sacerdotal. Ainda que um pastor seja um ministro de Deus, para ministrar as pessoas através dos dons ministeriais que lhe foram conferidos pelo próprio Jesus, um pastor, só é sacerdote dele mesmo, ou na condição de igreja que intercede pelo mundo e anuncia as Boas Novas de Jesus (I Pe 2.9). Porque o papel de sacerdote no período da Lei, era representar o povo diante de Deus, oferecendo sacrifícios pelos pecados. Já no Novo Testamento, através do Sacrifico feito por Jesus na cruz do calvário cada cristão individualmente, é um sacerdote. O Escritor aos Hebreus escreve: “Tendo, pois, irmãos, intrepidez para entrar no Santo dos Santos, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou pelo véu, isto é, pela sua carne” (Hb 10.19,20). Cada pessoa tem autoridade, conferida pelo sangue de Jesus, a se apresentar diante de Deus, humildemente em oração e súplicas em favor da sua vida.

Os líderes fraudulentos se colocam entre Deus e as pessoas, dizendo assim serem eles o intermediário para a solução dos problemas alheios e que Deus, jamais vai ouvir a pessoa que se coloca diante Dele por si só. Assim, se aproveitam da ingenuidade de alguns e da esperteza de outros, que preferem não gozar de comunhão com o Senhor, pois existe entre eles e Deus alguém que pode representar-lhes, sem que ele ou ela, tenha necessidade de mudar de vida. Por isso, ambos tem parte nesse negócio. É o ditado antigo que diz: “Você finge que me engana que eu finjo que acredito”. Com isso, o importante é que meus desejos sejam realizados, sem que haja mudanças.

As pessoas precisam ser libertas dessas correntes religiosas que manipulam e escravizam, em nome de personalidades pecadoras que se colocam entre Deus e os homens, atraindo para si glórias que nunca lhe foram conferidas. Não se deixe enganar, não existe outro mediador entre nós e Deus, se não, “Jesus Cristo, homem” (I Tm 2.5), e essa verdade deve ser libertadora para aqueles que desejam viver uma vida cristã longe das fraudes em nome do Evangelho.

Quero sinceramente que esse quadro mude e que a Igreja de modo geral, possa se posicionar com muitas vozes, contra toda essa picaretagem em nome da fé. Hoje existem muitos meios de comunicação que podem somar-se ao grito de chega, que está multiplicando entre a Igreja de Cristo.

Paz seja convosco!

André Santos

[1] YANCEY, Philip e STAFFORD, Tim. Desventuras da Vida Cristã, Editora: MC, p.39.40.
[2] DORNAS, Lécio. Ganhe Com as Perdas. Ed. Mk, p. 11

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