30 dezembro 2010

CAMINHANDO NO PASSADO

 

CAMINHANDO NO PASSADO...

Sim. Esse é o melhor título para minha última crônica de dezembro.
Após fechar a conexão, percebi que o sono custava-me a chegar.
Resolvi caminhar. Eram 5 horas da manhã, a energia física em pleno vigor, e o desejo de fazer algo concebido há muito: caminhar.
Foi o que fiz. Coloquei meu velho tenis, usado em minha primeira viagem a América, tenis que testemunhou os muitos lugares em que estive com minha ex-noiva Elienai, no Estado do Espírito Santo, Brasil. Tenis que me serviu quando eu era bem mais magro. Foi esse o tenis que chamei por cúmplice da minha loucura boêmia.
Saí portão afora. Que luar lindo! Lua cheia em plena aurora! Silêncio na rua, como soi acontecer nas ruas do interior paulista. Uma São Paulo adormecida, prestes a despertar para mais um dia de trabalho. Tão bonita quanto esta, que brilha lá fora hoje à noite, noite de 31 de dezembro de 2001...
Eram 5 da manhã e calculei o meu destino: iria fazer o caminho que por tantos dias, meses e anos fiz, em minha adolescência: o caminho para o BCN, onde eu trabalhava. "Ah, que saudades eu tenho da aurora da minha vida". Alí, naquelas ruas, estava eu novamente. Eu descia ao banco e subia 4 vezes ao dia e não ficava cansado! Daqui até lá são 12 quarteirões cheios de subidas e descidas, cheios de travessas e obstáculos. Decidi voltar ao meu tempo de office boy.
Que impressionante! Como as ruas se transformaram! As casas, dantes habitadas por gente que eu conhecia de "bom-dia, boa-tarde", agora com novas fachadas, novos carros, outras simplesmente deram lugar a enormes arranha-céus. Que vazio no meu peito, senti-me como um peixe fora d'água, pois o local era o mesmo, mas o tempo levou embora as coisas que me eram caras.
Cheguei ao BCN. Que tristeza! Uma faixa enorme dizia: "futuras instalações da faculdade SENAC". Aquele prédio, duplo, 7 andares, 486 funcionários, a quem eu conhecia nome por nome, a quem presenteei bíblias talvez para mais da metade deles, aquele prédio que conheço profundamente, conheço suas portas, suas salas, seus banheiros, suas escadas, seus elevadores, aquele prédio que ficava aceso dia e noite, agora estava todo apagado, empoeirado, como que a mostrar para um saudosista os fantasmas de anos e dias que nunca mais voltarão! Olhei para a porta e foi como se eu visse o guarda Lourival, o guarda Mello, os carros do despacho de agências, aquele entra e sai constante! Sombras de um passado antigo!

Decidi continuar o caminho para o bairro da Lapa. Caminhadas que fazia sempre, rumo a minha velha escola. Comecei a suar. Minha gordura impedia que eu me deslocasse como o jovem garotão de 16 anos de outrora. Casas modernas, novos comércios, a banca de jornal do seu Manoel, que já deve ter falecido há muito, novos tempos. E eu, o velho jovem, a reviver memórias de minha adolescência! Efemérides que nunca sonhei ter um dia!
Subi até a minha escola, onde aprendi a viver. Lá no Thomaz Galhardo eu comecei a estudar à noite. Lá eu comecei a ser homem, responsável. Lá eu namorei, lá eu vivi o meu tempo de convertido novo, lá eu criei meu primeiro ministério evangelístico, "Ministério Shalom", onde tínhamos cultos todos os dias na hora do recreio, com mais de 40 participantes. Lá que evangelizei meus colegas, colegas hoje casados, pais de família, cada um seguindo seu próprio rumo, seu próprio destino.
Mas, que surpresa! Nem o colégio era mais o mesmo! Nosso péssimo governo, verdadeiro rolo compressor de tudo que ainda prestava neste Estado, mudou a Escola Estadual de 1o. e 2o. Graus para Escola Estadual de Ensino Fundamental - ah, meu Deus, o grande Thomaz Galhardo, que formou gerações de trabalhadores e pensadores por tantos anos, que nos dava o preparo até o 3o. colegial, escola disputada na época, agora tornando-se apenas escola de primeiro grau, mormente com classes infantis! Nada contra o ensino de crianças, mas o Thomaz tinha o período da manhã para primário, o da tarde para ginásio e o da noite para colegial - uma autêntica sinfonia, com começo, meio e fim. Hoje, uma simples escolinha de bairro.
E eu olhei para o meu passado pelas paredes pixadas do meu colégio - foi como se escutasse os meus antigos professores a ensinar-me, a turma do fundão a bagunçar, os carros que vinham encontrar as namoradas à porta no final das aulas. Efemérides!!!

Retornei para casa. Descobri que há dois caminhos na vida: um é aquele em que se cultua o ontem, como único tempo de felicidade, mesmo que na época não tenha sido tão valorizado. E o hoje, que encara a realidade e procura tentar fazer das experiências atuais memoráveis para os dias futuros. Não temos escolha. Temos que continuar caminhando, ainda que deixemos para trás grandes recordações. Certamente que, ao longo do caminho, encontraremos experiências e pessoas tão boas e marcantes quanto as que tivemos nos tempos de outrora! Às vezes precisamos disso, desse reencontro conosco mesmos, com as ruas por onde caminhamos no antigamente...
Ah, se a lua cheia continuasse a brilhar como brilhava! Mas veio o sol e clareou o dia, sol que amanhã cedo brilhará sobre o Brasil...
"Senhor, obrigado por me deixar caminhar pelo meu passado por um pouco, relembrando quantas coisas o Senhor fez em mim, por mim e através de mim, relembrando dos amigos que deixei, dos professores que ajudaram na minha formação, do serviço que fez de mim um homem responsável e honesto, das oportunidades de evangelismo que tive.
Pr. Wagner Antonio de Araújo

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